sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

O Espelho

O espelho.
Se havia algo que ela odiava, era o espelho.
A mãe possuia uma coleção deles. Modernos, antigos, raros, bordados, delicadamente talhados. Ornamentando cada comodo da casa.
Ela nunca gostara de espelhos, mas um em especial: o espelho grande do corredor principal, aquele com a moldura talhada artesanalmente há mais de trezentos anos, o mais cobiçado, o mais adorado pela família e por qualquer visita. Aquele não era só um espelho, era sua consciência rispidamente a mostra.
Qualquer um acreditaria nas palavras, nas boas mentiras, nas cenas, no sorriso feito por trás da maquiagem sem erros. Menos o espelho. O maldito espelho que insistia em refletir seus olhos cheios de culpa e de medo, que mostrava descaradamente sua covardia e sua fraqueza, que expunha todos os sentimentos turvos que o lápis preto tentava esconder.
Seu quarto, o último do corredor, tornava inevitável o encontro com aquela imagem, sua imagem. A imagem que nenhum dos muitos amigos e conhecidos pensariam existir.
Tentava passar direto, despercebida, mas o magnetismo da sua alma com o vidro forçava-a a olhar.
E olhou. Viu seu reflexo perfeito, seus defeitos escondidos pelas bases, seus lábios desenhados, o corpo invejável, os cabelos bem cuidados, os olhos. Olhou fundo, tentando encarar seus próprios olhos. Fez-se física a imagem da dor de ser quem era. As mãos trêmulas, nó na garganta.
Junto aos cacos, gotas de um sangue vivamente vermelho misturavam-se a uma única lágrima, deixados para trás por uma aura ineditamente branca e uma coragem incomum para se libertar.



p.s.: não sei o que, de fato, me fez escrever esse texto.

7 comentários:

  1. Ôi!
    Amei o texto..
    Vi seu blog linkado no blog da Clarissa.
    Voce escreve muito bem! Parabens!
    Vou te linkar no meu tambem ta!
    Se puder..dá uma passadinha lá.Sempre escrevo umas coisas lá.
    Bjos!

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  2. Ei branquinha, valeu pelo comentario...
    Adorei seu novo texto, ele é do jeito do que eu mais gosto... suas prosas altamente descritivas q nos transportam pra qualquer lugar q vc quiser... bjim...

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  3. Profundo esse Shan!
    Muito bom(como sempre)
    ahah!
    Bjos!

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  4. Amor que lindo!!
    Sem palavras pra tanto talento!!!

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  5. Texto maravilhoso! Estava sentindo falta viu? Não some não...

    Me lembrei do livro "O Retrato de Dorian Gray" ao ler seu post, deve ser porque a personagem vê sua alma refletida de um jeito que ninguem mais vê, só que no livro o objeto em questão é um quadro que ele guarda à sete chaves.

    É um livro eu recomendo.

    Bjos

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  6. Nesse comentário não vou falar sobre o post pq já fiz isso, então...

    1- Não consegui encontrar a Ciranda da Bailarina com o Oswaldo (que puxa), mas no post tem um link (é só clicar no nome da música) para uma versão do Chico Buarque cantando ela. Mas valeu pela dica, vou continuar procurando

    2- Vienna é ma-ra-vi-lho-sa!!!

    E o meu pêésse...

    PS: Um ÓTIMO ano para vc, cheio de inspiração e coisas boas.

    Bjo.

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