segunda-feira, 19 de maio de 2008

Dos Escritos - Parte II


Então, depois de muito tempo ela sentou no velho e empoeirado sofá azul. Abriu mais uma vez o pequeno caderno de capa bordada há muito guardado na caixa de madeira roída, protegido por um cadeado de cor bronze-enferrujado. Sacudiu a caneta nanquim a fim de sentir o fluido da tinta que pensou estar seca. E escreveu.
Escreveu diferente, porque era agora uma garota diferente. Era agora mulher.
Leu o bilhete escrito na primeira página. Lembrou-se com carinho dos tempos atrás, mas screveu com seu novo coração; lembrou-se com carinho da irmã que fugira, tentando imaginar seus traços modificados pelos anos. Sentiu saudades. Pensava sua vida com maturidade, sem deixar por completo quem sempre fora. E escreveu.
A ponta da caneta deslizava pelas páginas amareladas numa sintonia perefita e, como mágica, histórias tomavam forma. Duas lágrimas brincavam em seu rosto até seguirem cada uma seu rumo (como ela mesma o faria). Uma pingou no papel, borrando de leve a tinta preta de uma palavra; enquanto a outra contornava o sorriso de acabara de se formar.
Não havia ainda parado de escrever quando, sem entender ao certo, o coração palpitou forte e o inesquecível cheiro do incenso de lotus tomou toda a sala. Sentiu-se tentada a olhar pela janela, mas algo a impediu de fazê-lo. Numa fração de segundo viajou no mais íntimo de sua memória e acordou pensando estar sonhando, mas a campainha havia realmente tocado.

Um comentário:

  1. Realmente, sabe-se lá o que nos acontece quando se tem a caneta em punho. A emoção está em escrever, mesmo que as vezes as palavras desencontradas pareçam traduzir sentido apenas aos autores. A escrita é o espelho da alma, de alguma forma.
    Ufa, seu post me fez pensar... E escrever!

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