sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Sobre Marias e Retalhos - I

De: maria.elis@mrmail.com
Para: nanita.m@mrmail.com ; nana_mariana@mrmail.com
Assunto: Cores, costuras e saudades

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Ei Ninha! Ei, Nana!

Hoje aconteceu uma coisa que me fez logo querer contar para vocês.
Vô Nestor chegou hoje, vai ficar aqui em casa mais ou menos uma semana por causa dos exames que eu tinha comentado antes. Minha avó não pode vir, disse que está muito atarefada, cheia de costuras pra entregar, por causa do bazar da igreja que ela sempre participa. Achei uma pena, mas eu sei o quanto ela se diverte ajudando. Sorte a dela que o vô Nestor não tem medo de fazer essas coisas sozinho. Às vezes isso me preocupa, fazer essas viagens longas sem companhia na idade dele. Mas ao mesmo tempo fico encantada! Parece até que ele tem a minha idade com todo aquele pique. Ah, ele perguntou por vocês. Disse que sente falta de nós três o dia inteiro na frente da banca de revistas dele, esperando as edições novas só por causa dos “moços estrangeiros”. Bem que era o melhor do dia!
Enfim, a vó Conceição não pode vir mas me mandou um presente. Adoro quando ela me manda presentes. Sempre sei que vai ser alguma coisa que eu vou querer levar comigo pro resto da vida. Lembram do porta moedas de pano com o nome bordado que ela fez pra cada uma de nós? Ando com ele até hoje na bolsa, ta meio surrado e desbotado, afinal a gente tinha o quê, uns onze anos quando ela fez? Pois é, dessa vez o que ela me mandou me fez viajar longe na minha imaginação e pensar em um monte de coisas boas. Ela me mandou uma colcha de retalhos. Uma colcha de retalhos tão coloridos, alguns lisos, outros estampados, e com um detalhe que eu sei que ela fez pensando em mim: no meio dela tem um pedaço de pano com o desenho de três estrelas em linha reta. As três marias, claro. Acho tão bacana quando ela faz essas coisas. Me bateu uma baita saudade quando eu vi esse detalhe. Depois disso, cada vez que eu olhava pra colcha já estendida na minha cama, cada retalho me lembrava alguma coisa que a gente já fez junta. Um laranja me lembrou do dia que eu rolei do alto do morro e apesar dos hematomas só fiquei com os joelhos esfolados – e vocês duas lá de cima rindo da minha cara, até resolverem perceber que o meu caso era uma pouquinho mais sério que isso. Por que o laranja? Acho que é porque o sol tava se pondo aquela hora e o céu tava lindo e colorido, com vários tons alaranjados.
Lembrei também do dia da bronca na diretoria, porque matamos uma aula inteira dentro do banheiro tentando fazer a Nana parar de chorar por ter perdido o ultimo dente de leite em sala de aula e tava morrendo de vergonha porque já tava com quatorze anos e ainda tinha dente de leite. Acho que foi o vermelho que me lembrou desse.
Sem esquecer do dia que a Ninha conseguiu realizar a proeza de ser a única a conseguir fazer aquele trabalho maluco de química que valia o trimestre e nós três tiramos nota boa por que era em trio. Esse foi culpa do azul! =)
Sei lá, são tantas as coisas que tenho na lembrança. E essa colcha me fez lembrar um pouco de tudo, como se cada retalho fosse uma história e as linhas que costuram uns nos outros fosse o resto que aconteceu na vida e nos trouxe até aqui. Só espero que a nossa colcha de retalhos nunca acabe de crescer.
Sinto falta de vocês. Vez ou outra me pego escrevendo sobre nós ou contando alguma dessas histórias pra alguém, com os olhos nostálgicos.
Acho que ninguém entenderia.

Saudades sempre,

Lis.



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